Entenda qual a jornada de trabalho dos bancários e quando há o direito às horas extras.
Quando o bancário tem direito a horas extras?
O trabalho dos bancários, por força do artigo 224, da CLT, tem duração normal de 6 (seis) horas diárias e 30 (trinta) semanais, uma conquista histórica da categoria que foi positivada na legislação trabalhista.
Estão excetuados do regime especial de jornada da categoria apenas os empregados que: (i) exercem função de confiança (direção, gerência, fiscalização, chefia ou equivalentes) e, assim, recebem a gratificação correspondente, não inferior a 1/3 do salário; e (ii) os ocupantes de cargos de gestão, diretores e chefes de departamento ou filial.
Desse modo, em relação às horas extras, existem 3 (três) espécies de regimes de trabalho bancário: (i) empregado ocupante de cargo comum que possui direito de receber pelo trabalho excedente à 6ª hora diária (art. 224, caput, CLT); (ii) empregado ocupante de cargo de confiança intermediária que possui direito de receber pelo trabalho excedente à 8ª hora diária (art. 224, § 2º, CLT); e (iii) os ocupantes de cargos de gestão que não têm direito a horas extras (art. 62, II, CLT).
É importante observar que a nomenclatura do cargo ocupado é irrelevante para definição do direito às horas extras, devendo serem analisadas as funções que são realizadas pelo empregado no dia a dia.
Muitos empregados que ocupam o cargo de gerente de relacionamento acreditam que pelo fato de trabalharem com a abertura de conta corrente, aprovação de crédito/limite ou liberação de determinados pagamentos exercem cargo de confiança, mas, na verdade, todas as suas funções são condicionadas à aprovação superior, seja de um supervisor ou comitê/mesa de crédito. Esses empregados que, na prática, meramente, realizam o atendimento a clientes, vendem produtos financeiros do banco, preenchem formulários e alimentam sistemas de dados, devem se enquadrar no regime de trabalho de 6 horas diárias e não de 8 horas.
Portanto, os funcionários tratados como “gerentes, especialistas ou analistas sênior” podem, numa eventual ação trabalhista, descaracterizar o do suposto cargo de confiança e passar a ter direito à 7ª e 8ª horas diárias. Da mesma forma, os empregados que são tratados como gestores e são, na verdade, gerentes, podem ter direito às horas extras excedentes à 8ª diária.
É possível ter direito à 7ª e 8ª horas extras mesmo recebendo a gratificação de função?
Mesmo que o empregado receba gratificação de função, esta deve estar atrelada à fidúcia (confiança) depositada no trabalhador, o qual deve ocupar posição hierárquica superior e desempenhar função diferenciada em relação aos demais, com maiores poderes e mais responsabilidades.
É uma prática comum das instituições financeiras pagarem a empregados que não exercem função de confiança tal gratificação numa tentativa de, assim, afastar o direito às horas extras, o que não é admitido pela jurisprudência pacífica dos Tribunais Nacionais:
BANCÁRIOS. CARGO DE CONFIANÇA. FIDÚCIA DIFERENCIADA. DESCARACTERIZAÇÃO. Para a caracterização do exercente de cargo de confiança bancária nos moldes delineados no § 2º do art. 224 da CLT, necessário que o bancário atenda a dois requisitos de forma simultânea, quais sejam, o recebimento de gratificação de função não inferior a 1/3 do salário do cargo efetivo e que a função seja de maior relevância em relação aos demais empregados, que demande maior fidúcia, mediante o desempenho de atribuições que o diferencie do bancário comum. Sendo a regra geral a jornada de seis horas diárias para os bancários, cabe ao empregador comprovar que o trabalhador ocupava cargo de confiança que o enquadre na exceção do art. 224, §2º da CLT, a fim de elidir o direito do empregado às horas extras, porquanto se trata de fato impeditivo do direito vindicado (art. 333, II, CPC c/c art. 818/CLT), o que não restou comprovado nos autos.
(TRT da 3.ª Região; PJe: 0011159-58.2018.5.03.0079 (RO); Disponibilização: 26/06/2020, DEJT/TRT3/Cad.Jud, Página 489; Órgão Julgador: Terceira Turma; Redator: Milton V.Thibau de Almeida)
É relevante destacar que a gratificação de função habitual integra o salário do empregado (art. 457, § 1º, CLT) e, por isso, deve repercutir na base de cálculo das demais parcelas salariais, como, por exemplo, férias e décimo terceiro salário.
Assim, a gratificação de função, apesar de vinculada ao cargo exercido pelo empregado, se paga durante muitos anos, pode ser incorporada à remuneração, não podendo mais ser suprimida, já que aderiu ao contrato de trabalho (art. 468, CLT), sob pena de ofensa ao princípio que veda a alteração contratual lesiva (Súmula nº 372, TST).
De outro lado, a gratificação de função, mesmo quando paga a funcionário que não exerce cargo de confiança, não pode ser compensada com as horas extras que o obreiro tenha direito (Súmula nº 109, TST).
Como são calculadas as horas extras?
As horas extras são calculadas a partir do salário-hora que é correspondente à remuneração total do empregado (salário base) dividida pelo divisor legal de acordo com a jornada de trabalho exercida, isto é, 180 para 6 horas ou 220 para 8 horas diárias de labor.
O trabalho em sobrejornada deve ser remunerado em, no mínimo, 50% a mais que o trabalho normal e, além disso, as horas extras repercutem nas demais parcelas salariais (reflexos), tais como FGTS, Repouso Semanal Remunerado, Férias +1/3, aviso prévio, saldo de salário e outros.
Exemplo prático: o bancário que percebe remuneração média de R$ 6.000,00 (salário + premiações, gratificações e comissões) e tem direito à 7ª e 8ª horas extras durante os últimos 5 anos trabalhados:
R$ 6.000,00 (salário) / 180 (divisor) x 1,5 (adicional legal) = R$ 50,00 (hora extra) x quantidade de horas (2 horas/dia x 22 dias úteis x 60 meses) = R$ 132.000,00 + reflexos (em média 30%).
O que fazer quando o direito às horas extras não é respeitado?
Caso a instituição financeira negue o pagamento às horas extras trabalhadas, o bancário deve, primeiramente, observar se o seu registro de ponto corresponde à realidade e, caso contrário, se municiar de documentos que comprovem a jornada efetivamente trabalhada.
É possível, por exemplo, o empregado, após encerrar a sua jornada de trabalho, enviar mensagens/e-mails para os seus superiores para registrar o fim do horário de trabalho.
Além disso, é importante também o bancário guardar as informações e documentos relativos às suas atividades diárias, sobretudo que demonstrem que não detém autonomia compatível com a suposta confiança que seria inerente ao cargo ocupado.
Em qualquer caso, o empregado poderá se valer de testemunhas, principalmente de colegas de trabalho, para atestar os fatos discutidos.
Portanto, os empregados bancários devem estar atentos aos seus direitos que, caso violados, podem ser reclamados na Justiça do Trabalho.
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